Jó 30:24 "A verdade é que ninguém dá a mão ao homem arruinado, quando este, em sua aflição, grita por socorro.
25 Não é certo que chorei por causa dos que passavam dificuldade? E que a minha alma entristeceu-se por causa dos pobres?
26 Mesmo assim, quando eu esperava o bem, veio o mal; quando eu procurava luz, vieram trevas.
27 Nunca para a agitação dentro de mim; dias de sofrimento me confrontam.
28 Perambulo escurecido, mas não pelo sol; levanto-me na assembléia e clamo por ajuda.
29 Tornei-me irmão dos chacais, companheiro das corujas.
30 Minha pele escurece e cai; meu corpo queima de febre.
31 Minha harpa está afinada para cantos fúnebres, e minha flauta para o som de pranto.
Jó está no auge da dor e sofrimento quando diz essas palavras, suas perdas foram grandes e de forma rápida, Jó não esperava passar por isso por conta de uma mentalidade que está bem clara nas suas palavras, e claro, que faz todo sentido, pois entendemos que vivemos a lei da semeadura, o que plantamos colhemos.
Tragédia e decepção são coisas bem diferentes, Jó está experimentando as duas coisas, tragédias são coisas ruins que acontecem inesperadamente, como as perdas de bens, filhos e saúde que Jó sofreu, decepção são coisas ruins que acontecem quando esperamos o melhor, como aconteceu com Jó referente aos seus irmãos, amigos e aqueles quem ajudou.
Por se ver em uma situação vulnerável e precisando de ajuda, Jó espera que aquilo que um dia ofereceu a pessoas em situações semelhantes seria retribuido, mas isso não aconteceu, Jó então diz: "a verdade é que ninguém dá a mão ao arruinado".
Seria isso verdade? Pois o próprio Jó era alguém que fazia o bem aos necessitados, ao falar isso estava desconsiderando tudo o que fizera um dia.
Existem algumas lições importantes e preciosas nesse texto, primeiro, não devemos fazer nada por interesse ou troca, temos que tomar cuidado ao colocar expectativas em pessoas, pois elas podem nos frustrar e decepcionar, mesmo sendo aquelas que nós mais ajudamos. A falta da mão estendida de alguns nesse momento da vida de Jó o fez acreditar que ninguém faz o bem ao necessitado, não podemos generalizar e julgar todos por causa de um ou alguns, considerando que a bondade que semeamos na vida de alguém, talvez não colheremos dessa mesma pessoa, pois a semente é nossa e só podemos oferecer aquilo que temos, mas o campo é de Deus e em algum momento certamente colheremos os frutos da bondade semeada.
Uma dia conversei com um líder, uma pessoa muito usada por Deus e que já havia ajudado muita gente, ele sempre fez o bem sem ver a quem, nunca mediu esforços, sempre paciente para ouvir, doando seu tempo, seus conselhos e abraços, um dia ele viveu um vale em sua vida, crises emocionais e espirituais, ele acabou se fechando na expectativa de que as pessoas que ajudou vissem sua dor e o procurassem para ajudá-lo, isso durou um bom tempo até que então frustrado passou a acreditar que ninguém faz o bem, passou a pensar que ninguém se preocupava com ele, pois dizia ter ajudado muitas pessoas e agora ninguém percebeu que ele estava precisando de ajuda, ninguém lhe deu um abraço, nem mesmo mandaram uma mensagem.
Eu perguntei a ele se havia pedido ajuda a alguém, ele me disse que não, que todos deveriam perceber isso e ajudá-lo. Ao ler sobre Jó pensei nele, alguém que sempre esteve em condições de ajudar e ajudou, porém na vida de Jó estava clara a sua situação de vulnerabilidade, mas esse líder estava aparentemente bem, pois sua dor, sua crise era interna e ele se esforçava para não passar isso para as outras pessoas.
Naquele dia ao conversar com ele percebi que, mesmo quando ele ajudava as pessoas acreditando que não fazia por troca, ele fazia, mesmo que ao longo prazo, pois no momento em que ajudava, não necessitava tanto de ajuda, mas no momento da dor, ele esperou ser retribuído, ele quis de volta o que ofereceu. Penso que em uma situação dessas é difícil ajudar alguém que acreditamos ser mais forte do que nós, alguém que nos ajudou e que não apresenta sinais de fraqueza, não neste caso, pois ele esperou e nessa espera, além do seu vale e de sua dor ele acabou acrescentando mais esse dilema ao coração, a decepção com seus amigos e aqueles que havia ajudado, algo que poderia ser resolvido se ele simplesmente procurasse ajuda.
É claro que nós esperamos sempre sermos tratados bem pelos outros, mas vamos analisar o que Jesus nos ensinou sobre as nossas atitudes para com os outros e a atitude dos outros com relação a nós, nem sempre iremos receber o bem que oferecemos, por isso a Bíblia vai nos orientar a não nos cansarmos de fazer o bem (Gl 6.9).
Não devemos fazer acepção de pessoas, nem mesmo julgá-las, mas olha bem o que Jesus disse:
Mateus 7:1 "Não julguem, para que vocês não sejam julgados.
2 Pois da mesma forma que julgarem, vocês serão julgados; e a medida que usarem, também será usada para medir vocês.
3 "Por que você repara no cisco que está no olho do seu irmão, e não se dá conta da viga que está em seu próprio olho?
4 Como você pode dizer ao seu irmão: ‘Deixe-me tirar o cisco do seu olho’, quando há uma viga no seu?
5 Hipócrita, tire primeiro a viga do seu olho, e então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão.
6 "Não dêem o que é sagrado aos cães, nem atirem suas pérolas aos porcos; caso contrário, estes as pisarão e, aqueles, voltando-se contra vocês, os despedaçarão".
Jesus traz dois ensinamentos neste texto, primeiro sobre o julgamento hipócrita, segundo sobre a necessidade de avaliação que precisamos fazer das pessoas que estão ao nosso redor. Talvez você pergunte, se não devemos julgar, então devo fazer avaliação das pessoas? Não seria o mesmo que julgar?
Sim, o que Jesus não quer, é que o nosso julgamento seja hipócrita, mas que precisamos ser pessoas com capacidade de julgar com sabedoria de acordo com uma avaliação justa, por exemplo, Jesus ao dizer para não tirarmos o cisco do olho do irmão, ou seja, querer consertar o erro do irmão, enquanto no nosso olho tem um problema maior e que nós ignoramos, mas que, ao resolver o problema da nossa vida, devemos então ajudar sim os nossos irmãos com seus problemas.
O mesmo Jesus que diz para não julgar, diz para identificarmos aqueles que agem como cães e porcos, ou seja, nós temos a responsabilidade de avaliar quem são essas pessoas, tomando o cuidado de não sermos piores do que aqueles que entendemos ser cães e porcos em sua atitude.
Por que isso?
Trazendo Jó para esse contexto, ele esperou que suas pérolas lançadas um dia fossem valorizadas, não somente isso, ele esperou o retorno do bem oferecido, só que isso não aconteceu, nesse contexto precisamos entender que, a forma como cada um vai lidar com seu próximo é uma questão de natureza, por mais que você ofereça pérolas (coisas do Reino de Deus), não dá para esperar dos cães e dos porcos mais do que isso que Jesus está apresentando, o perigo de insistirmos em falar e tratar os cães com amor, considerando os cães daquela época que eram animais selvagens, que andavam em bandos colocando o terror nas cidades, bem diferente dos pets que vemos hoje, seria como tratar bem aqueles que sempre e certamente irão avançar em nós para morder e despedaçar, já os porcos são animais que culturalmente são imundos para os judeus por conta das leis estabelecidas por Deus sobre animais imundos, neste caso que Jesus usou como exemplo nem precisaríamos considerar essas questões culturais, mas sim a natureza do porco, pois o contraste é, eu ofereço algo de inestimável valor para alguém que valoriza mais a lama ou a sujeira, nos parece que Jesus está nos aconselhando, "não perca seu tempo", ou "cuidado, você vai se decepcionar com essa pessoa, pois ela não vai valorizar o que você faz por ela". Infelizmente em alguns casos não há como fugir dessa decepção, por outro lado, muitos fazem alianças com pessoas com características semelhantes a desses animais citados por Jesus, seria como casar uma ovelha com um cão ou um porco, a ovelha sempre agindo como ovelha e o cão ou o porco sempre retribuindo conforme sua natureza.
Em nossos dias, se não tivermos essa sabedoria e equilíbrio emocional, vejamos o quanto isso pode gerar problemas semelhantes ao de Jó, desacreditarmos na capacidade que o ser humano têm de fazer o bem. Tipo isso:
"Fazer o bem a quem não valoriza pode acabar nos levando a acreditar que fazer o bem não vale a pena, pois não há valorização e não há retribuição do bem feito e isto nos impedir de ser um instrumento de bondade".
É o que Jó declara agora, no meio da dor, que seus "instrumentos" agora só tocam tristeza, ou seja, Jó não se vê mais em condições de expressar a mesma alegria e bondade, pois sua situação lhe parece impossível, não só por conta de sua doença e pobreza, mas pela sua falta de fé no ser humano.
Seria possível oferecer aos outros o bem que não recebemos? Oferecer aquilo que nos falta? Quem faria isso?
Veremos o que Paulo diz:
2 Coríntios 6:1 Como cooperadores de Deus, insistimos com vocês para não receberem em vão a graça de Deus.
2 Pois ele diz: "Eu o ouvi no tempo favorável e o socorri no dia da salvação". Digo-lhes que agora é o tempo favorável, agora é o dia da salvação!
3 Não damos motivo de escândalo a ninguém, em circunstância alguma, para que o nosso ministério não caia em descrédito.
4 Pelo contrário, como servos de Deus, recomendamo-nos de todas as formas: em muita perseverança; em sofrimentos, privações e tristezas;
5 em açoites, prisões e tumultos; em trabalhos árduos, noites sem dormir e jejuns;
6 em pureza, conhecimento, paciência e bondade; no Espírito Santo e no amor sincero;
7 na palavra da verdade e no poder de Deus; com as armas da justiça, quer de ataque, quer de defesa;
8 por honra e por desonra; por difamação e por boa fama; tidos por enganadores, sendo verdadeiros;
9 como desconhecidos, apesar de bem conhecidos; como morrendo, mas eis que vivemos; espancados, mas não mortos;
10 entristecidos, mas sempre alegres; pobres, mas enriquecendo a muitos; nada tendo, mas possuindo tudo.
Não recebemos em vão a graça de Deus, a recebemos para manifestar as boas obras de Cristo, essa palavra não pode apenas estar em nosso pensamento, ela precisa correr nas nossas veias, precisamos ser movidos por ela, ainda que passando por todas essas coisas citadas por Paulo (algumas eu marquei, pois tem tudo a ver com o que Jó estava passando), somos movidos por essa graça e não pelas situações favoráveis.
Os irmãos da Macedônia também são um exemplo dessa graça abundante, ofereceram além do que podiam, além do que possuíam, mesmo que aparentemente limitados:
2 Coríntios 8:1 Agora, irmãos, queremos que vocês tomem conhecimento da graça que Deus concedeu às igrejas da Macedônia.
2 No meio da mais severa tribulação, a grande alegria e a extrema pobreza deles transbordaram em rica generosidade.
3 Pois dou testemunho de que eles deram tudo quanto podiam, e até além do que podiam. Por iniciativa própria
4 eles nos suplicaram insistentemente o privilégio de participar da assistência aos santos.
5 E não somente fizeram o que esperávamos, mas entregaram-se primeiramente a si mesmos ao Senhor e, depois, a nós, pela vontade de Deus.
Essas palavras são inspiradoras, falam mais uma vez da capacitação que a graça de Deus dá a nós como igreja, pois passamos a entender que privilégio é poder dar assistência e não somente receber assistência, que pobreza extrema e severa tribulação não são capazes de abalar nossa alegria e atar nossas mãos quando estamos diante de alguém que precisa de ajuda.
Jó diz que o som que saí de sua vida neste momento é de uma música fúnebre, sons de pranto. Considerando que somos instrumentos nas mãos de Deus, responda para si mesmo, que som está saindo de sua vida, de sua maneira de lidar com os problemas e lidar com aqueles que estão ao seu redor?
"Que de nós o mundo possa ouvir o som das boas obras do Todo Poderoso."
A maior batalha que Jó enfrenta não está onde os homens podem ver, como ele diz, "nunca para a agitação dentro de mim". O campo de batalha da mente.
Deveríamos olhar com muita atenção para isso, pois deveríamos considerar a guerra em que estamos contra um inimigo que não dorme, Jó em alguns momentos oscila em sua fé, diz que sabe que seu redentor está vivo e que se levantará em seu favor:
Jó 19:25 Eu sei que o meu Redentor vive, e que no fim se levantará sobre a terra.
Também diz estar sem esperança do futuro:
Jó 6:11 "Que esperança posso ter, se já não tenho forças? Como posso ter paciência, se não tenho futuro?
Sua fé nos homens também foi muito abalada, veremos suas palavras referente a decepção com seus irmãos e isso também serve para seus amigos.
Jó 6:14 "Um homem desesperado deve receber a compaixão de seus amigos, muito embora ele tenha abandonado o temor do Todo-poderoso.
15 Mas os meus irmãos enganaram-me como riachos temporários, como os riachos que transbordam
16 quando o degelo os torna turvos e a neve que se derrete os faz encher,
17 mas que param de fluir no tempo da seca, e no calor desaparecem dos seus leitos.
18 As caravanas se desviam de suas rotas; sobem para lugares desertos e perecem.
19 Procuram água as caravanas de Temá, olham esperançosos os mercadores de Sabá.
20 Ficam tristes, porque estavam confiantes; lá chegaram tão-somente para sofrer decepção.
Jó se refere a seus irmãos e amigos como se fossem fontes ou riachos fluentes em sua mente, só que na realidade ao buscar ajuda neles, encontrou lugares secos, fontes secas que nada podiam fazer para ajudar. Eu aprendo aqui que não podemos decepcionar aqueles que nos veem como fontes e aprendo que existem coisas e momentos que teremos que passar sozinhos, ou melhor, teremos que passar juntos do Senhor, pela fé, pois se nossa fé estiver baseada em situações favoráveis, não veremos Deus conosco.
Esse texto nos ajuda a entender a mentalidade na nossa sociedade, pois a decepção em algumas esferas nos faz realmente desacreditar, por exemplo, temos uma grande parte de brasileiros desacreditados na política, pois por muitos anos acreditamos em homens que se colocaram como fontes e acabaram trazendo seca para a nação e para os estados, temos mulheres dizendo que homens não prestam, que homens são mentirosos, porque viram seus pais violentando e traindo suas mães, temos uma sociedade desacreditando na família por conta dos divórcios, temos pessoas desacreditadas na igreja, pois viram escândalos por aqueles que esperavam ser exemplo. Precisamos ser fontes, precisamos ser aqueles que vão estender a mão, mas também precisamos ter maturidade para saber que sempre haverá pessoas que poderão nos decepcionar.
O capítulo 42 do livro de Jó mostra a virada que sua vida deu quando sua provação acabou, Jó teve seus bens restituídos, teve filhos e viveu por muitos anos, mas antes de tudo isso que foi restituído a Jó, a Bíblia faz questão de dizer o que primeiro Jó recebeu, e ao meu ver, o que Jó liberou.
Jó 42:11 Todos os seus irmãos e irmãs, e todos os que o haviam conhecido anteriormente vieram comer com ele em sua casa. Eles o consolaram e o confortaram por todas as tribulações que o Senhor tinha trazido sobre ele, e cada um lhe deu uma peça de prata e um anel de ouro.
Jó pôde servir seus irmãos e aqueles que o conheceram antes, pessoas que não passaram com ele no momento mais difícil, pessoas que não estenderam a mão quando mais precisou, Jó não viveria o resto de sua vida com mágoas, não os permitiu estar na sua mesa para se vangloriar de agora estar por cima mais uma vez, pelo contrário, demonstrou mais uma vez sua nobreza, revelou o coração do homem que chamava a atenção de Deus com sua vida, as suas decepções não lhe fez uma pessoa amarga e vingativa, ele não tinha que provar nada para ninguém.
Talvez você pergunte o por que dessas pessoas aparecerem para consolar e confortar Jó somente depois que tudo passou, a vida é assim e Jó é um exemplo, existem situações que passaremos sozinhos, nestes momentos devemos colocar nossa expectativa em Deus, muitas vezes teremos de lidar com o abandono de todos, até mesmo da nossa família e o silêncio de Deus, mas ficar firmes, pois Deus sabe o que faz.
Espero que este texto te faça refletir e que renove sua esperança, a vida de Jó continua até hoje transmitindo um som diferente do que ele falou no momento de intensa aflição, ela toca o som de um adorador que inspira esperança.
Deus te abençoe!